BOOKING E SUPREMA CORTE DOS EUA – Uma decisão proferida pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América, no dia 30 de junho de 2020, está causando impacto na propriedade intelectual global, por quebrar paradigma de base. Esta decisão não foi unânime (8 x1) e teve por relatora a Ministra Ruth Guinsburg.
Segundo a referida decisão, a expressão BOOKING.COM poderia ser registrada como marca. Tal entendimento contraria a posição de um dos mais importantes escritórios governamentais de marcas do Mundo, o United States Patent and Trademark Office – USPTO, o INPI americano. E não somente daquele órgão, mas certamente os congêneres de outros países, como o INPI brasileiro.
ENTENDA O PARADIGMA ROMPIDO
Grande parte do mundo é signatário dos mesmos acordos internacionais de propriedade intelectual. Os países adotam, em geral, grande parte do conteúdo dos tratados, excluindo apenas determinadas parcelas normativas, para fins de adaptação com seus sistemas jurídicos internos.
Há um paradigma, todavia, que é aceito por muitos estados partes e que diz respeito aos registros de marcas: não podem ser aceitos como direitos de exclusiva ou direito de uso exclusivo como marca registrada, as palavras ou expressões descritivas ou genéricas em relação ao segmento protegido.
Explica-se: marcas são deferidas por classes de produtos e serviços. Termos que são de uso corrente, genéricos ou comuns à um segmento, não podem pertencer a ninguém, porque isso significaria uma vantagem indevida de um titular de marca perante os demais.
Vale dizer, a livre concorrência estaria sendo rompida através desta via. Esta é uma compreensão de base, aceita por quase todos.
No Brasil, a lei 9279/96, através do artigo 124, VI, não permite tal registro. Os pedidos formulados em infração a tal dispositivo, são indeferidos pelo INPI. E normalmente o são também pelo USPTO (ou eram – não se sabe como será, doravante). Confira:
Art. 124. Não são registráveis como marca:
IV – sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar uma característica do produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade e época de produção ou de prestação do serviço, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva.
Compreensão similar vige nos EUA. O USPTO, órgão americano, havia indeferido o pedido de registro formulado por Booking Holdings Inc, seguindo justamente essa lógica de base. A empresa de Amsterdã festejou seu departamento jurídico americano, que conduziu o caso através do advogado David Bernstein. O porta voz do USPTO, Paul Fucito, quando procurado pela imprensa americana, não quis se manifestar sobre o caso.
A COMPREENSÃO DA DECISÃO AMERICANA
O tema somente chegou à Suprema Corte Americana em razão de uma decisão administrativa que anteriormente havia indeferido o pedido de registro da expressão BOOKING.COM como marca comercial.
No dia 04 de maio de 2020 a Suprema Corte dos EUA realizou a primeira sessão de sustentação oral em razão do Corona Vírus, justamente em tal caso. O argumento do advogado Bernstein, foi o de que a permissão para a Booking usar o nome BOOKING.COM como marca evitaria o parasitarismo por parte de empresas que estariam se aproveitando do aspecto genérico da marca.
No dia 16 de maio de 2020 foi protocolada petição de AMICUS CURIAE, por parte da terceira NEW YORK Intellectual Property Law Association – NYIPLA.
O voto vencedor foi antecedido de pesquisas de opinião junto à população, a respeito da visão das pessoas sobre a empresa BOOKING inc. e da expressão BOOKING.COM.
No voto vencedor, a Relatora Ruth Guinsburg ressaltou que “Como ‘Booking.com’ não é um nome genérico para os consumidores, não é genérico” …
Para concluir que “Não temos motivos para negar à Booking.com os mesmos benefícios que o Congresso concedeu outras marcas qualificadas como não genéricas” .
O voto dissidente, proferido pelo Ministro Stephen Breyer argumentou que os votos vencedores valorizaram excessivamente o conteúdo de pesquisas de opinião pública, as quais tem um limite de valor para uma decisão desta ordem. Afirmou em seu voto que “refere-se a um serviço de reserva na Internet, que é o produto genérico que o entrevistado e seus concorrentes vendem. Nem mais nem menos ”
Assim e em resumo, para o citado Juiz essa decisão poderia acarretar uma corrida de registros de termos genéricos, formando uma massa de empresas com poder suficiente para “sufocar” a concorrência de forma indevida: “Ao tornar esses termos elegíveis para proteção de marcas registradas, temo que a decisão de hoje leve a uma proliferação de marcas” generic.com “, concedendo a seus proprietários o monopólio de uma zona de domínios úteis e fáceis de lembrar”.
A decisão sem dúvida é disruptiva e pode vir a ser o marco inicial da desconstrução e reconstrução de conceitos de base das marcas no mundo. Ao fim, inserimos o link para acesso da íntegra da decisão da Suprema Corte americana.
Participaram do julgamento:
GINSBURG, J., ROBERTS, C. J., and THOMAS, ALITO, SOTOMAYOR, KAGAN, GORSUCH, and KAVANAUGH, JJ., joined. SOTOMAYOR, J.. E de forma dissidente, BREYER, J.
LINKS EXTERNOS
– United States Patent and Trademark Officce – USPTO
Carlos Ignacio Schmitt Sant Anna (c) blog MONTUP www.MarcasePatente.com.br