No final de junho de 2020 foi promulgada a Lei 14.017/2020, denominada Lei Aldir Blanc, que foi o artista que faleceu por decorrência de COVID19. Em Agosto, passado, foi editada a regulamentação dos repasses, através da Lei 14.036, de 2020.
O diploma legal foi editado para o fim de criar verba emergencial para setor da cultura, tendo em vista a permanência da Pandemia.
Esta lei é mais conhecida por todos em razão do inciso I, do artigo 2 que prevê o auxílio mensal ou subsídio de R$600,00 aos “trabalhadores e trabalhadoras da cultura”.
O artigo 4 explicita que “compreendem-se como trabalhador e trabalhadora da cultura as pessoas que participam de cadeia produtiva dos segmentos artísticos e culturais descritos no art. 8º desta Lei, incluídos artistas, contadores de histórias, produtores, técnicos, curadores, oficineiros e professores de escolas de arte e capoeira”
Mas nem todos receberão. Apenas aqueles que se enquadrarem nos requisitos do artigo 6º:
Art. 6º Farão jus à renda emergencial prevista no inciso I do caput do art. 2º desta Lei os trabalhadores e trabalhadoras da cultura com atividades interrompidas e que comprovem:
I – terem atuado social ou profissionalmente nas áreas artística e cultural nos 24 (vinte e quatro) meses imediatamente anteriores à data de publicação desta Lei, comprovada a atuação de forma documental ou autodeclaratória;
II – não terem emprego formal ativo;
III – não serem titulares de benefício previdenciário ou assistencial ou beneficiários do seguro-desemprego ou de programa de transferência de renda federal, ressalvado o Programa Bolsa Família;
IV – terem renda familiar mensal per capita de até 1/2 (meio) salário-mínimo ou renda familiar mensal total de até 3 (três) salários-mínimos, o que for maior;
V – não terem recebido, no ano de 2018, rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70 (vinte e oito mil, quinhentos e cinquenta e nove reais e setenta centavos);
VI – estarem inscritos, com a respectiva homologação da inscrição, em, pelo menos, um dos cadastros previstos no § 1º do art. 7º desta Lei; e
VII – não serem beneficiários do auxílio emergencial previsto na Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020.
- 1º O recebimento da renda emergencial está limitado a 2 (dois) membros da mesma unidade familiar.
- 2º A mulher provedora de família monoparental receberá 2 (duas) cotas da renda emergencial.
De todos os requisitos específicos a artistas, ressalta-se um genérico e, bastante lógico: não ter recebido ou não estar recebendo o auxílio emergencial previsto na Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020.
A diferenciação da presente lei – ALDIR BLANC – para a lei n. 13.892/20, reside no fato de que o auxílio se estende para entidades ou pessoas jurídicas, em valores de R$3.000,00 a R$10.000,00. Desde que atendidos os requisitos, dentre os quais a inscrição cadastral em uma das entidades citadas no artigo 7º.
E também pela expressa previsão de auxílio prevista no inciso III, do artigo 2º, através de “III – editais, chamadas públicas, prêmios, aquisição de bens e serviços vinculados ao setor cultural e outros instrumentos destinados à manutenção de agentes, de espaços, de iniciativas, de cursos, de produções, de desenvolvimento de atividades de economia criativa e de economia solidária, de produções audiovisuais, de manifestações culturais, bem como à realização de atividades artísticas e culturais que possam ser transmitidas pela internet ou disponibilizadas por meio de redes sociais e outras plataformas digitais.”
A respeito de tal inciso, o texto da Lei Aldir Blanc parecer ser omisso, já que não explicita nada mais sobre o tema do benefício do inciso III. E nem mesmo na curtíssima redação da regulamentação de agosto.
Tal omissão poderá gerar inúmeros incidentes no manejo das verbas federais de socorro do setor cultural, já que silencia sobre o que, como e em que termos efetivamente o legislador quis dizer quanto ao inciso III.
Da parte deste blog, que se assenta e transpira propriedade intelectual, chama a atenção para o trecho legal que refere expressamente que a proteção se estende à “… aquisição de bens e serviços vinculados ao setor cultural e outros instrumentos destinados à manutenção de agentes …”.
A atividade artística, como um todo, concede ao artista direitos que estão medularmente vinculados à viabilização do ato de criação ou ato artístico. Ser artista pode ser uma profissão. Aqui diz-se pode, porque existem artistas que criam, mas não retiram disso o seu sustento.
Afora os direitos morais previstos na lei. 9610/98 – existente mesmo para aqueles que não retiram ou não pretendem extrair da atividade artística o seu sustento -, os demais direitos visam garantir a dignidade pessoal do artista como trabalhador.
Dentre estes direitos de natureza patrimonial – e portanto, relevantemente funcionais -, estão aqueles advindos da propriedade intelectual.
A propriedade intelectual é segmento de direito que engloba os direitos de autor e a propriedade industrial. O público sabe que os Autores aparentemente vinculam-se mais aos direitos de autor, que protege as suas obras, execuções e performances, direta e indiretamente.
Porém, cada vez mais os artistas protegem-se através de registros de marcas, para evitar oportunismos e de forma a resguardar eventuais dúvidas advindas de situação surgidas ao acaso e distantes da má-fé. Isso ocorre porque os registros de marca, em geral, liquidam com dúvidas quanto a autorização para atuar com esta ou aquela nominação artística.
Há, ainda, organizações, entidades ou certamente, que exigem registro de marca, como requisito de contratação do artista. Soma-se, ainda, o fato de que o ganha pão do artista pode restar seriamente abalado pela confusão de oportunistas, já não bastassem os graves problemas da pandemia.
Parece não haver muitas dúvidas de que despesas em ferramentais para a boa consecução do ato artístico, estão incluídas nos benefícios previstos no inciso III, do artigo 2º: aquisição de bens e serviços vinculados ao setor cultural e outros instrumentos destinados à manutenção de agentes
Seria um erro imaginar que o socorro possui natureza estritamente alimentar (os R$600,00/mês), já que a atividade artística precisa mais do que alimentos para o artista, para realizar-se e resguardar o acervo patrimonial cultural (que é formado pelos artista, suas obras e pelo tecido econômico-cultural – destrua-se o tecido cultural e sua reconstrução será muito mais custosa e demorada).
O objetivo do legislador não é somente viabilizar o alimento direto ao artista, mas manter o palco (ainda que enfoque preferencial por atividades na web – artigo 13).
Parece ser lógica e razoável a interpretação de que serviços de marca e quaisquer outras despesas com direito de autor integram o inciso III. Assim, custas processuais e honorários de advogado em defesas de direitos de autor ou ações judiciais para o direito de apresentar-se publicamente em caso de embargo, parecem que se inserem no inciso III.
Entretanto, não é difícil prever dificuldades para obter os benefícios para tais, fins, já que a lei é omissa e possui aparência nitidamente alimentar. Melhor seria se o legislador tivesse sido mais preciso. No entanto, aquilo que o legislador nxplicita, deixando lacunas, tacitamente permite que a mesma possa ser preenchida pela dicção judicial.
LINKS EXTERNOS:
– Lei 14.017/2020 – Lei Aldir Blanc
– Lei 14.036, de 2020 – Regulamento
Carlos Ignacio Schmitt Sant´Anna © Setembro/2020 www.MarcasePatente.com.br – BLOG MONTUP